terça-feira, 20 de setembro de 2011

Há necessidade de mais fundos na luta contra o SIDA

Por Eduardo Quive
Foto: Rogério Manhique      

Nos dias de hoje as emergências são maiores, várias são as preocupações do quotidiano e por isso corre-se o risco de se esquecer de um dos problemas mais graves que a sociedade enfrenta – o SIDA. A organização humanitária, Médicos Sem Fronteira (MSF), preocupada com esse cenário, criou um Intervalo para chamar atenção à necessidade de mais fundos para a luta contra o SIDA, concretamente o que diz respeito ao acesso maioritário ao tratamento antiretroviral. Dados de 2009 da mesma organização, indicam que 33.000 pacientes dos MSF recebem tratamento com antiretrovirais, o correspondente a uma taxa de cobertura de 30% dos 1.6 milhões de pessoas com HIV/SIDA em Moçambique. Ainda de acordo com a MSF, 33.4 milhões de pessoas vivem com HIV/SIDA em todo o mundo, destes, 22.5 milhões encontram-se na África Subsaariana. O tratamento com antiretrovirais em todo mundo, apenas cobre a 4 milhões de pessoas, e em Moçambique, falta o acesso ao tratamento para 430 mil pessoas.

No Projecto Intervalo, levado a cabo pelos Médicos Sem Fronteiras (MSF) com a realização de actividades desportivas, procura-se aumentar a consciencialização dos riscos decorrentes da falta de fundos para a luta contra a SIDA.
Justifica-se ainda a realização do projecto, pelo facto de “no jogo contra o HIV/SIDA estarmos ainda na metade do tempo. Registaram-se progressos, mas não é a hora de se parar, pois milhões de pessoas ainda necessitam urgentemente de medicamentos que salvam vidas” diz a mensagem da MSF.
Através de uma série de actividades desportivas conduzidas por 24 pessoas que vivem com HIV dos países do Sul de Africa, concretamente, África do Sul, Malawi, Swazilândia, Zimbabwè e Moçambique, o Intervalo procurou demonstrar formas de sucesso pelas quais a MSF e seus parceiros tem vindo a abordar os desafios do tratamento do HIV nas áreas onde a prevalência das infecções do vírus é maior, mas os recursos são baixos.
Aliás, uma das maiores preocupações é não ver paradas as acções de financiamento para os programas de combate à esta pandemia, pelo que, até 2015 a nível mundial a meta é atingir 15 milhões de pessoas seropositivas, com acesso ao tratamento antiretroviral, ultrapassando deste modo os sete milhões actualmente abrangidos.
Walter Lorenzi, chefe da missão MSF em Moçambique, disse que o maior problema em Moçambique não é de recursos humanos, mas sim a falta de fundos para obter os antiretrovirais que tanta falta fazem para muita gente.
De acordo com Lorenzi, dentre vários esforços que a MSF têm envidado para a luta contra a epidemia no País, a organização apoia dois projectos para permitir melhor tratamento e seguimento aos casos de HIV/SIDA.
“Temos um projecto a desenvolver em Mavalane, cidade de Maputo, e existe uma estratégia nacional de grupos comunitários de seropositivos que melhoram o tratamento ao HIV. Em Moçambique temos mais de 12 mil pessoas que se beneficiam directamente dos nossos projectos, as quais apoiamos no tratamento e acompanhamento, e não podemos parar”, disse.
A MSF está em Moçambique desde o princípio do ano 2000 com o projecto “Hospital Dia” onde começaram os tratamentos antiretrovirais em 2002, na província de Tete e Mavalane em Maputo.

Encerramento de hospitais dia

Os desafios de Moçambique, estão na falta de recursos humanos para o Sistema Nacional de Saúde (SNS), faltam recursos financeiros e os médicos não são suficientes. Esse é o principal desafio do País. O encerramento dos hospitais-dia não é uma coisa negativa, a ideia é para melhorar o atendimento, criar a descentralização e integração. Quando se fala de descentralização, significa que os doentes em tratamento passam a ter atendimento em todas as unidades sanitárias do SNS. Integração significa que o tratamento é feito em todas as estruturas.
Por seu turno Leonardo Chavane, em representação do Ministério da Saúde, reconhecendo que se registam sucessos no tratamento de pessoas vivendo com HIV/SIDA, disse que a situação desta epidemia continua uma emergência em África e na região autral do continente em especial.
Chavane, disse ainda que Moçambique é um dos países da sub/região, que teve um desempenho assinalável durante esse período, incluindo inovações locais de impacto internacional como a experiência de Grupos de Apoio e Adesão da Comunidade, contudo, apela cada vez mais à comunidade regional e internacional para a necessidade da continuidade de financiamento e dos esforços de luta contra o SIDA na região.
“Até 2015, gostaríamos de ver reduzidas as infecções, parar e começar a inverter a propagação do HIV por via sexual em 50%, e eliminar a transmissão vertical do HIV”, acrescentou Leonardo Chavana, dando a conhecer as apostas do governo moçambicano de, igualmente inovar ferramentas para testes e reduzir as mortes por tuberculose em 50%.
Outro facto que o representate do Ministério da Saúde fez alusão, foi a questão dos dados estatísticos, referentes ao número de pacientes recebendo tratamento antiretroviral que, segundo a MSF, ainda está aquém do desejado, sendo que o défice ronda para os 430 mil pessoas.
“Penso que a questão de dados é relativa. É verdade que não conseguimos cobrir a todos doentes, mas pode ser que tenhamos mais gente a beneficiar do tratamento do que o ilustrado nos dados dos MSF, tendo em conta que outros pacientes estão nas zonas recomendadas”. Disse.

História de superação
Sousa Chilaule, seropositivo que se assume

Sousa Chilaule residente do Infulene, no Município da Matola, descobriu que é seropositivo depois do ano 2000. Desde 2003 recebe o tratamento contra Sida numa clínica em Maputo.
Chilaule é um exemplo de superação na luta contra o estigma, e é homem que luta no dia-a-dia pela vida sem receios, assumindo o seu estágio de saúde e dando as caras sempre que for necessário. Mesmo no princínpio da conversa com a nossa equipe de reportagem, ele fez questão de dizer “sou seropositivo, podem tirar fotos, sem receio, não tenho medo porque considero-me uma pessoa com doença comum”. Era a resposta a um pedido de autorização que o fizemos para este trabalho.
Sousa Chilaule falou-nos da sua adaptação quando descobriu que era seropositivo.
“Fiquei muito doente e fui para muitos hospitias, mas não acusava em nada. Isso nos finais dos anos 90. O meu estado físico estava debilitado quando descobri que era soropositivo. Por isso logo aconselharam-me a começar o tratamento antiretroviral. Estou a fazer o tratamento atiretroviral desde 2003 e sinto-me bem de saúde. Tenho uma vida normal”.
Por outro lado, preocupa ao nosso entrevistado, o cenário vivido actualmente, que diz respeito a redução de orçamento para o apoio aos programas do HIV/SIDA.
“Estamos a ouvir na mídia que o financiamento para o HIV está a ser reduzido, e não sabemos porquê e como. Fala-se de crise económica e mundial, não sabemos se vai nos afectar ou não”. Disse.
É um facto que o SIDA já não é uma doença que cria frustração nas vidas. Trazemos aqui, um exemplo concreto de superação e de quem faz tudo pela vida. Tem sonhos. Tem filhos e é casada e é feliz.
Pela aparência, é impossível saber que Antónia Fortunato vive com o vírus do SIDA, conversando com ela, perante o ânimo que tem no seu discurso, pelo optimismo que alimenta e espelha, é hoje um exemplo de vida a seguir no mundo desta doença.
Antónia, conta-nos que já não há tanta descriminação para as pessoas vivendo com o HIV/SIDA. Por outro lado, os próprios cidadãos com esta doença, são solidários entre si.
“Há doentes que basta iniciarem o tratamento ficam em casa e pensam que é tudo, mas nós visitamos e aconselhamos a seguir as recomendações médicas principalmente, sobre as doenças oportunistas”.
Antónia Furtunato, mesmo seropositiva sonha
“Sinto-me uma mulher livre e até sinto-me igual às mulheres que não tem o virus. Tenho em mente que se não tivesse conhecimento desta doença, e se não seguisse os tratamentos estaria morta. Mas abri a vista, fui fazer o teste, descobri que sou seropositiva, aderi ao tratamento e estou bem porque quero ainda viver, e quero ver os meus filhos a crescer. Tenho filhos pequenos que ainda precisam de mim”.

É verdade. Antónia Furtunato é mãe de cinco filhos. Dois deles são seropositivos, porque amamentou sem os devidos cuidados, mas o último não tem porque já tinha conhecimento que era possível preveni-lo da doença.
Mesmo com o conhecimento do seu estado de saúde, Antónia tem muitos sonhos. Se calhar mais que pessoas saudáveis. E ela conta que enquanto continuar viva vai sonhar.
“O meu maior sonho é ver os meus filhos a crescer e singrarem na vida. Tenho até forças para trabalhar, se tivesse um emprego ia me empenhar nisso”.
Antónia Fortunato tem 39 anos, e descobriu que era seropositiva em 2005, já era casada e tinha quatro filhos. É natural da província de Tete, no centro do País.

Celebridades juntam-se à causa

Moreira Chonguiça-Músico e Tico-Tico, jogador de futebol

Moreira Chonguiça – Músico
Sinto-me honrado por fazer parte desta iniciativa em que paramos para dar uma mão a uma causa dos nossos irmãos. Espero que Moçambique, África e o mundo em geral vença neste jogo da vida. O SIDA é uma realidade, e é preciso que ganhemos a consciência e temos que viver e celebrar este problema para combatê-lo.
A música no geral e aquela que eu faço em particular, tem sempre uma mensagem que tocam a vários aspectos sociais e vários conceitos da vida humana.
A causa do HIV/SIDA não é nova para mim, venho trabalhando há alguns anos com as Nações Unidas e o Conselho Nacional do Combate ao SIDA, e já fiz várias músicas com mensagem de luta e já trabalhei com vários artistas por essa causa.
Os seropositivos precisam ser fortes para ultrapassar as dificuldades. Estávamos aqui com pessoas que vivem com o vírus há 19 anos, e isso transmite uma esperança para muitos, sendo que o acesso ao tratamento antiretroviral é outra componente importante.

Tico Tico – Jogador de futebol
Podemos vencer O SIDA. As pessoas seropositivas podem ter uma vida activa e positiva, e ao se aproveitar o desporto para ilustrar isso, e eu me envolver é algo importante.
Através da escolinha que sou patrono, nós ensinamos crianças sobre a vida, aspectos sociais e de saúde, e acho que esta mensagem de vida serve também para ensinar as crianças que esta doença não é o fim. Ela existe, há necessidade de prevenção e para quem aposta, a vida continua.
Outro facto importante é envolver as pessoas vivendo com o HIV na sociedade, acho que tem que se fazer muito nessa vertente.
Penso que o desporto, particularmente o futebol concentra mais pessoas, e assim é fácil passar a mensagem. Por exemplo um jogo de futebol da selecção nacional, o Estádio da Machava enche e aí é possível levar a mensagem de vida. Pena que quando ainda estava na selecção não era chamado para iniciativas do género.

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